sexta-feira, 20 de dezembro de 2019

Quando brasileiros caçavam proboscídeos

Humanos abatendo um filhote de Notiomastodon platensis. Pleistoceno onde hoje está a região arqueológica Lagoa Santa Karst, em Minas Gerais, Brasil.

A cena se baseia na descoberta do crânio de um Notiomastodon de cerca de 1 ano de idade apresentando uma perfuração causada por um artefato humano, onde a natureza e o local da perfuração apontam que o golpe foi desferido para matar o animal. Trata-se de evidência inédita de que humanos caçaram proboscídeos na América do Sul.

É interessante notar que a mulher ilustrada é baseada na reconstrução do crânio de "Luzia", um dos mais antigos e importantes fósseis humanos sul-americanos. Ela se prepara para golpear o filhote de Notiomastodon que caído sobre seu lado direito, posição inferida pela direção da perfuração.

A ilustração foi realizada em 2016 a convite e supervisão de Leonardo Avilla e Dimila Mothé. Foi um prazer ilustrar esse importante achado! Muito obrigado!

Confira a pesquisa no artigo:
Mothé, D., Avilla, L. S., Araújo-Júnior, H. I., Rotti, A., Prous, A., & Azevedo, S. A. K. (2020). An artifact embedded in an extinct proboscidean sheds new light on human-megafaunal interactions in the Quaternary of South America. Quaternary Science Reviews, 229, 106125. https://doi.org/10.1016/j.quascirev.2019.106125



terça-feira, 26 de novembro de 2019

Targaryendraco

Targaryendraco wiedenrothi, um recém descrito pterossauro cujo nome homenageia o fenômeno Game of Thrones. Mas o mais interessante sobre ele não é o nome, e sim sua contribuição para o nosso entendimento sobre toda uma linhagem de pterossauros.
Tive o prazer de realizar a reconstrução do Targaryendraco para uma matéria do National Geographic sobre o novo pterossauro. Muito obrigado ao Rodrigo Vargas Pêgas pelo convite, e parabéns pela descoberta!

Confira a matéria:


segunda-feira, 11 de novembro de 2019

Gerrothorax

O temnospôndilo Gerrothorax pulcherrimus, plagiossaurídeo com cerca de 1m de comprimento que viveu do Triássico Inferior ao Superior. Seus fósseis foram encontrados na Alemanha, na Suécia, na Groenlândia e na Tailândia. Sua existência por tão vasto intervalo de tempo e de espaço, mantendo basicamente a mesma forma, revela um animal bem sucedido e com boa flexibilidade ao seu ambiente - ele inevitavelmente precisava estar em um corpo d'água, mas apresentava boa tolerância ao tamanho e salinidade do local, onde provavelmente caçava espécies diversas (sem depender de uma presa específica).

Gerrothorax foi um predador que deveria emboscar no fundo de rios, lagos, pântanos e estuários. Sua forma de capturar as presas já foi abordada por vezes na literatura, e uma ideia comum é a de que o animal pudesse permanecer em repouso, com a mandíbula imóvel, e abocanhar (ou tragar pela sucção da água) a presa apenas por elevar rapidamente o crânio, que confere uma ampla mordida por si só, mesmo sem abaixar a mandíbula (um trabalho relativamente recente detalha essa capacidade). Um estudo posterior concluiu, no entanto, que abrir a boca apenas erguendo o crânio, sem mover a mandíbula, não deixaria espaço para seu aparato hiobranquial se retrair e gerar a sucção da água e da presa para a boca. Como solução, foi pensado que, uma vez detectado o alimento, Gerrothorax levantaria a cabeça (talvez também um pouco do corpo) com a boca fechada, e então abriria a boca levantando o crânio e abaixando a mandíbula. Com essa ação, sim, o aparato hiobranquial se retraia, expandindo então a cavidade bucal e possibilitando a sucção da água e da presa. Sua musculatura permitiria que a boca abrisse e fechasse com rapidez, e a água sugada podia ser liberada pelas guelras.

Seu corpo era achatado e protegido por uma armadura de placas. Seus membros posteriores se voltavam para trás (um pesquisador chegou a comparar essa condição à das focas), seguindo a direção da cauda. A cauda em si era um tanto curta, então as pernas deveriam agir junto dela como uma nadadeira horizontal única para garantir a propulsão durante o nado. Os membros anteriores, portanto, teriam pouco papel para nadar e seriam mais úteis para ajudar a se apoiar ou se locomover no fundo das águas em que habitava.

Porcelana fria, escala 1:5.














Hoje entendemos que um Gerrothorax adulto não teria guelras externas (visivelmente semelhantes, por exemplo, às do atual axolotle), uma concepção comum no passado. Além desse plagiossaurídeo ter características associáveis a guelras internas, pesquisadores identificaram em seu esqueleto o que funcionaria como a "câmara" da guelra interna. Também questionaram por que um animal de corpo tão bem protegido manteria partes tão sensíveis, como as guelras, expostas, uma lógica que concorda com elas terem sido estruturas internas.

 Por valores nostálgicos, porém, o modelo têm guelras externas removíveis para que possa ser exposto também numa versão "retrô", bastando removê-las para voltar à versão moderna, de guelras internas, quando desejado.




quinta-feira, 7 de novembro de 2019

Conodontes

Novos "conjuntos" de conodontes. As peças baseadas na original apresentada na exposição "Paleo Brasil - A Pré-História invadiu a Estação".

Conodontes são (não sob consenso absoluto) vertebrados ágnatos que viveram do Cambriano ao Triássico. Eles foram, por mais de 100 anos, conhecidos apenas por seus microscópicos dentes (chamados de "elementos conodontes"), o que gerava um imenso mistério acerca de como seriam as criaturas donas de tais microfósseis. Em 1983, foi descrito o primeiro fóssil com impressões do que seria o corpo de um conodonte, revelando um pequeno animal (cerca de 4 cm de comprimento) de corpo longo, nadadeira caudal e o que parecia ser seu par de olhos. Desde então, mais alguns raros fósseis com impressões do corpo foram descobertos, nos fornecendo mais detalhes sobre a aparência desses misteriosos animais.

Porcelana fria. Espécies indeterminadas em escala aumentada indefinida.





domingo, 22 de setembro de 2019

Sharovipteryx

Sharovipteryx mirabilis, um esquisitíssimo animal conhecido por um único espécime fóssil, quase completo, proveniente do Triássico Superior onde hoje se localiza o Quirguistão. Este arcossauromorfo é notável por suas pernas muito longas e dotadas de membranas/patágios, formando algo como asas triangulares nos membros posteriores.

O animal foi descrito, junto do pterossauro Sordes, por Aleksandr Sharov em 1971. Foi inicialmente nomeado como "Podopteryx", mas como tal nome já era usado tanto para um gênero de inseto quanto para outro de peixe, em 1981 o estranho réptil foi renomeado por Richard Cowen como Sharovipteryx, em homenagem a Sharov.

Em 1987, o fóssil foi reexaminado e redescrito em mais detalhes por Carl Gans, Ilja Darevski e Leonid P. Tatarinov, e esta é a principal publicação referenciada para a reconstrução nesta escultura. Além de dar atenção às medidas e às impressões de pele e escamas, os autores se aprofundaram na distribuição das membranas, corrigindo alguns equívocos da descrição original e buscando entender sua extensão segundo a preservação do fóssil. Por meio de um modelo, o estudo também experimentou a capacidade de planar do animal.

Os membros anteriores não podem ser verificados com precisão pelo fóssil (partes faltam ou foram perdidas na preparação do espécime), que aparentemente não mostra indícios de patágios nos braços. Uma análise mais precisa sobre seu voo planado, que pela primeira vez utilizou-se da aerodinâmica nos testes, aponta, porém, que o animal se beneficiaria de pequenas membranas nos braços, especialmente para dar segurança ao pouso após planar. Dada a imprecisão dessa área no fóssil e os resultados do estudo citado, a reconstrução apresenta o Sharovipteryx com um patágio modesto nos membros dianteiros, ainda que não no formato exato sugerido na publicação.

A coloração retratada busca um padrão apropriado para a camuflagem do dorso em meio a troncos e liquens, e as cores vivas no lado inferior das "asas" imitam folhas secas que caem de árvores, facilitando a discrição do animal visto por baixo ao planar (algo observado nos lagartos voadores Draco, e que pode ter sido vantajoso também ao Sharovipteryx).

Porcelana fria, escala 1:1.