Um vale em Wyoming, EUA, durante o Eoceno. Após o evento de extinção no fim do Cretáceo e a dizimação dos dinossauros não-avianos, os mamíferos experimentaram sua grande ascenção, ocupando numerosos nichos com formas e tamanhos mais variados do que nunca. Surgiram feras bizarras, grupos que não deixaram descendentes atuais e criaturas que ofereciam um vislumbre do que seriam suas linhagens tão prósperas e, para nós, marcantes hoje em dia.
Em uma floresta rodeada de montanhas e vulcões, um lago reúne animais sedentos, famintos ou apenas em busca de um leve frescor. A figura central trata-se de um visitante, um grande Tetheopsis sp. com um crânio de ~90 cm e cerca de 4 m de comprimento. O animal é conhecido da Formação Washakie, localizada mais ao sul e de idade equivalente (porém mais extensa) à da Fm. Bridger, e a ilustração parte da premissa de que essa espécie possa ter passado pela Formação "vizinha". Seus parentes definitivamente encontrados na região também são vistos na área, com um casal de Uintatherium anceps bebendo no lago. Esses animais eram ligeiramente menores que o Tetheopsis (crânios com aprox. 70 cm e também beirando os 4 m), e exibiam um dimorfismo sexual bem evidente, especialmente nos chifres.
Essas feras são dinoceratos, grupo com parentesco difícil de decifrar, mas atualmente compreendidos como parte da Laurasiatheria, que inclui os mamíferos ungulados, morcegos, pangolins e a ordem Carnivora. Dinoceratos teriam sido especialmente próximos dos extintos xenungulados, mas há contestação quanto a isso.
Com mais de 2,5 m do focinho à ponta da cauda, um Patriofelis ferox sai da água com uma tartaruga Chisternon undatum abatida, saciando assim tanto a sede quanto a fome. Acreditava-se que esse era um caçador semiaquático devido às suas patas espalmadas, mas tal ideia é hoje descartada - o que, claro, não o impediria de aproveitar oportunidades de caçar algo na água, como na imagem.
Ainda no lago, capturando moluscos, há um par de pequenas Aletornis gracilis, um gênero bastante variado com fósseis (sempre bem fragmentários) indicando espécies que iam desde o tamanho de narcejas, como as retratadas, até quase tão grandes quanto um flamingo. Tais espécies já sofreram contestação, e o gênero talvez englobe aves de diferentes grupos. Mais ao fundo, na margem, o lagarto Saniwa ensidens de "quatro-olhos" (contando com o par de olhos comuns, o olho pineal e o olho parapineal) bebe e se aquece ao sol.
Partindo para o primeiro plano da cena, vemos movimentação no solo e na copa das árvores. No canto superior esquerdo, um Vulpavus ovatus descansa sobre o galho de uma árvore Lauraceae, sem notar que é observado pelo hienodonte Sinopa major logo abaixo. No canto direito, duas Notharctus tenebrosus fêmeas, primatas com cerca de 40 cm (sem contar a longa cauda), se alimentam das folhas de uma árvore Sapindaceae. Em galhos próximos, um casal de Zygodactylus sp. tenta impedir formigas gigantes Titanomyrma sp. (operárias com ~3 cm) de avançar em direção ao seu ninho com filhotes. Pelo solo, uma Boavus occidentalis, serpente com ~2 m, rasteja entre as folhas secas, enquanto uma Chimaeroblattina sp., inseto que mimetiza vespas, voa pelo canto inferior esquerdo.
Ao fundo, pelo lado esquerdo e adentrando a floresta, aparece um caçador que rivaliza em tamanho com o Patriofelis: medindo quase 2 m (fora a cauda), um Mesonyx obtusidens, predador ungulado basal com aspecto superficial de canídeo, segue um bando de Orohippus pumilus, pequenos equídeos com pouco mais que meio metro de comprimento.
Finalizando os animais ilustrados, outro "visitante": a grande (~2 m de altura) ave Gastornis sp., que forrageia entre as plantas no centro da imagem, atrás do lago. O animal não é conhecido diretamente da Fm. Bridger, mas sua passagem pela região é especulada com base nos seus registros em outra Formação próxima, a Fm. Green River - assim como os Zygodactylus, as Titanomyrma e a Chimaeroblattina.
A flora inclui sequoias distantes, palmeiras (Sabalites) próximas da margem e samambaias espalhadas pelo solo, parte das raras plantas fósseis conhecidas da Fm. Bridger. Green River também inspira a flora dessa época e região retratada na cena, expandindo a variedade de plantas com uma floresta mais rica em angiospermas formada por árvores como carvalho, canela e bordo, além das outras sapindácea e laurácea já citadas no primeiro plano, e algumas cucurbitáceas presentes no solo.
Entre as rochas na margem do lago, a erosão revela um tesouro que conta um pouco da história que antecedeu essa paisagem, mostrando parte do crânio de um Torosaurus.
Nova arte para o projeto Tales from the Phanerozoic, de João Macêdo. Confira aqui o capítulo sobre o Eoceno, com a história por trás da cena e informações detalhadas sobre o ambiente e as criaturas.